As bandeiras do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) se somaram às de outros movimentos sociais e sindicais, camponeses e urbanos. No enfrentamento às forças conservadoras que colocaram a democracia em risco através do golpe parlamentar imposto à presidente Dilma Roussef e à perseguição jurídica (lawfere) imposta sobre o presidente Luís Inácio Lula da Silva, a palavra “resistência” ganhou um novo sentido no país.

O protagonismo dos lutadores e das lutadoras do povo reafirma uma vocação de classe, onde camponês e operário se dispõem a andar de braços dados, assumindo a vanguarda na defesa da democracia contra o neoconservadorismo e fascismo latentes que assombram os dias atuais. A leitura dos fatos dos últimos dias, que culminam com o presidente Lula se apresentando à Polícia Federal para atender ao mandado de prisão expedido pelo juiz Moro de Curitiba, provocou reflexões entre dirigentes e base do movimento.


Para Leila Denise, dirigente do estado de Roraima, a resposta vai vir de forma coletiva, do meio popular. “Acredito que a resposta vai se dar de forma organizada, com o povo, e eu quero estar junto com esse povo que puxar a resistência não só na defesa de Lula, mas na construção de uma sociedade mais justa e igual”. Para Leila, os movimentos devem permanecer alertas e preparados, relembrando que o que os setores conservadores fizeram com o presidente Lula “com pessoas simples podem fazer de forma pior ou mais violenta”.

De Pernambuco, Vani Souza reforça a ideia de que os movimentos sociais hoje são novamente chamados a assumir uma tarefa a qual nunca se recusaram a protagonizar: “Hoje somos convocados a lutar pelos sonhos e pela dignidade que o povo brasileiro, que os pobres desse país, que homens e mulheres do sertão ao litoral, do Sul ao Norte desse Brasil pode ter”. Para Vani, a tarefa de “defender esses sonhos, defender a liberdade, defender a justiça e a dignidade cabe a todos nós”. Quanto ao Lula, ela concorda que não se trata apenas de defender a figura do melhor presidente que o país já teve, mas também “é defender a ideia de que o povo pode, de que somos um povo erguido, de um povo altivo, não de um povo que baixa a cabeça aos seus algozes”.





 Um posicionamento forte veio do dirigente Bruno Pillon, do Espírito Santo, ao manifestar-se no palanque em frente ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em são Bernardo do Campo, durante a vigília em defesa de Lula antes de ele decidir se apresentar à PF: “Aqui tem a coragem de quem luta dia a dia, de quem enfrenta a seca e a geada de norte a sul desse país para produzir alimento, aqui ninguém tem medo de juiz nenhum”, afirmou. “Nós estamos dispostos a escrever a história desse país e história não é escrita por covardes”, emendou relembrando que os grupos de diversos segmentos da juventude camponesas estavam reunidos em São Paulo para sua escola de memória e sentiram-se desafiados a assumir a vanguarda da resistência popular naquele momento em que através dos ataques a Lula, a própria democracia é que estava sendo ferida de morte.

Anderson Amaro da Bahia usou as palavras do próprio Lula em seu discurso para responder ao chamado histórico: “Nós seremos as pernas, seremos a voz, seremos a mente, seremos o coração de Lula nas ruas, no meio do povo, no campo e na cidade, pelo retorno à democracia e pela liberdade do nosso eterno presidente”. Para ele, a fala de Lula e a resposta imediata do povo, representam a certeza do surgimento de uma grande frente de mobilização popular. “É bem como ele disse, podem prender a carne, mas não podem prender as ideias, não podem prender os pensamentos”, relembrou. “Os ideais representam um legado que nós temos a obrigação de levar adiante”, arrematou, assegurando que o MPA e os demais movimentos da Via Campesina vão seguir denunciando ao Brasil e ao mundo o golpe que está em curso no Brasil, a prisão política a que está submetido o presidente Lula e a violência constante que está sendo praticada contra o povo.

Impressões contrastantes foram expressadas pela dirigente Maria Cazé, do MPA do Piauí: “O sentimento imediato foi de indignação, depois de tristeza e decepção, por ver em que se transformaram as instituições do Estado”. Para ela, essa instituições estão de fato se confirmando como a representação “das velhas prostitutas do capital internacional”. Depois, porém, ela frisa que o compromisso histórico faz o moral se elevar e o espírito de luta recuperar toda seu vigor: “É nessa hora que fala mais alto um senso de responsabilidade em continuar firme na luta por um país justo e soberano, pois se eles não descansam um minuto, nós não podemos vacilar”.

– A decisão de Lula de se apresentar para enfrentar seus inimigos e cumprir o mandado de prisão de cabeça erguida, sendo conduzido nos braços do povo, diz muito -, comenta Valter Israel, dirigente do MPA no estado do Paraná. “Trata-se de alguém que tem consigo a certeza e a segurança de que fez muito por seu país e pelo seu povo, alguém que possui a tranquilidade dos inocentes, emanando força e segurança para a militância que segue a luta cotidiana aqui do lado de fora”. Para Israel, a atitude de Lula, enfrentando com dignidade seus opressores é motivo para despertar sentimentos de orgulho e renovar a energia para que se proceda o enfrentamento a todo tipo de injustiça que ainda se pratica nesse país. “Vamos nos alimentar desta forca e indignação e transformá-laa em organização e luta”, garantiu.
Do extremo sul do país, o dirigente da Via Campesina, Frei Sérgio Görgen, expressou uma síntese de postura que os movimentos sociais e todas as demais forças representativas que estejam dispostas a participar das iniciativas de resistência democrática devem ter como norte: “Precisamos nos preparar para um processo de luta prolongada, não só para conquistar a liberdade do Lula, mas para organizar as massas, ganhar a eleição presidencial e iniciar um tempo de grandes transformações no Brasil”. Görgem expressa a compreensão de somente a luta de massas pode frear o avanço do conservadorismo e do fascismo que hoje representam a pior face do golpe. Resistência é a palavra de ordem, esperança é a bandeira simbólica, lutar é a prática indispensável. “O tempo é de grandes lutas, só com lutas conquistaremos transformações profundas e necessárias..”

A síntese proposta por Görgen encontra resposta na militância pelo país afora. “Ousadia, animação e muita luta, porque enquanto tiver vida, enquanto tiver esperança e enquanto tiver povo a democracia e a dignidade vão estar de pé -, assinala a pernambucana Vani. “O sangue do povo brasileiro traz o DNA de grandes lutadores, gente como Zumbi e Dandara, e é de raízes como essas que vamos buscar força para seguir lutando incansavelmente”, arrematou o capixaba Pillon.



Por Adilvane Spezia e Marcos Antonio Corbari. Eles são jornalistas, camponeses e militantes do MPA