De passagem pela quinta vez na Bahia, Caravana da juventude chega à região Sudoeste.
Desde que retornou a terras baianas, no fim de abril, a Caravana Nacional de Luta Camponesa Clodomir de Morais, formada por jovens camponeses da base do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA),  já realizou atividades em cinco municípios no Sudoeste da Bahia. A região localizada em torno de Vitória da Conquista, a terceira maior cidade do estado, tem a agricultura com forte presença de pequenos produtores tradicionais. “É a quinta vez que visitamos a Bahia desde que nossa Caravana iniciou, é um estado muito grande e sempre traz muita mística com sua história e suas pessoas” conta Fernanda Luz, integrante do grupo. “Nosso trabalho nesta região foi voltado pra atividades com a juventude, com rodas de conversa e oficinas, e na ajuda da construção do Mutirão da Esperança Camponesa”, explica a jovem.

Candido Sales, na divisa com Minas Gerais, foi o primeiro município visitado. Durante os dias 28 e 29 de abril a Caravana e a militância local organizaram um seminário de formação para juventude na Comunidade de Agua Verde, localizado as margens da BR 116. “Quando o jovem assume o seu papel e sai da zona de conforto, ele tem nas mãos o poder de mudar uma realidade onde os demais ainda estão alienados por diversas situações do contexto atual”, quem fala é a jovem Daiane, de 25 anos, uma das participantes do seminário. O papel da juventude neste momento que o Brasil enfrenta foi o principal tema abordado pela formação, que contou com muita animação. O trabalho no município foi finalizado com intervenções teatrais na feira popular na segunda-feira, 30 de abril.

Presidente Jânio Quadros recebeu a Caravana nos três primeiros dias do mês de maio. No dia qual lembra os trabalhadores e as trabalhadoras, 1º de maio, os integrantes participaram de uma atividade para formadores sobre o Congresso do Povo, organizado pela Frente Brasil Popular. Uma linda noite cultural foi organizada na Praça Alípio Ferreira para lembrar a luta da classe trabalhadora, a Caravana apresentou a todos os presentes a peça de teatro “O massacre aos direitos sociais”, abordando o tema do desmonte dos direitos a partir das reformas propostas pelo governo Temer. A juventude seguiu sendo a pauta principal dos outros dois dias de formação. “Em Jânio Quadros a Caravana ajudou a dar uma animada na nossa juventude, em Candido Salles e Cordeiros a Caravana plantou uma semente, já em Aracatu ela ajudou a colocar o MPA pra fora, muitas pessoas ficaram sabendo o que é o Movimento” analisa Denilva Santos, da direção estadual.

Em Cordeiros, no sábado, 5 de maio, a Caravana participou de um evento literário e cultural de arrecadação de livros infanto-juvenis realizado pelo colégio Joaquim Gonçalves. E no domingo, 6, junto com jovens do município, realizaram na Biblioteca Pública David Apolônio da Silva um encontro de formação para a juventude rural. Durante a atividade foi oferecida uma oficina de teatro e apresentações no encerramento do dia. Além dos participantes, quem assistiu às peças criadas, foram os livros presente nas prateleiras da biblioteca. As obras de Jorge Amado, Cecília Meireles, Érico Veríssimo, entre tantos outros escritores assistiram duas peças de teatro criadas pelos jovens de Cordeiros. Ambas abordaram a situação do jovem no campo que, muitas vezes, sem incentivos, acaba saindo do interior para tentar melhorar de vida na cidade grande.

Não é a primeira vez que este tema aparece quando os integrantes da Caravana apresentam a pedagogia do teatro do oprimido aos jovens. “É uma realidade dos sertões nordestinos, o jovem, muitas vezes não tem oportunidades de trabalho, lazer e cultura em suas comunidades e acaba ouvindo a versão que as redes de TV tem sobre as cidades grandes, que é uma visão voltada para o consumo”, observa o jovem caravanista Jhonata Maurilio. “Nosso trabalho é despertar na juventude a vontade de fazer a sua comunidade um lugar com oportunidades” conclui. Para a jovem cordenrense, Allane Silva: “a passagem rápida da Caravana no nosso município, reacendeu o pavio de muitos jovens, para continuarem a lutar por direitos. Foram apenas dois dias, mas que ao decorrer podem se transformar em anos de aprendizagem”.


Aracatu, primeiro município a acolher o Movimento dos Pequenos Agricultores na Bahia, recebeu a Caravana durante o Mutirão da Esperança Camponesa nas comunidades da região da Serra Negra, localizada a 27km do centro da cidade. Durante os dias 7 e 8 de novembro as comunidades de Lagoa do Sal, Santo Antônio, Arrecife, Tabori, Caetanos, Adobe 1 e Adobe 2 foram visitadas pelos jovens e outros militantes da região. O Mutirão da Esperança é uma ação do MPA em todos os estados onde o Movimento está presente, para fortalecer o vinculo com os camponeses e as camponesas e ainda debater temas pertinentes da atual conjuntura do país. Nesta região o Mutirão teve um caráter especial, reavivar a autoestima de uma região marcada pelo esquecimento e desleixo de políticas públicas voltadas às comunidades tradicionais.

Segundo Dorival da Cruz, integrante da coordenação do MPA na região, a comunidade tem uma organização cultural muito semelhante às comunidades quilombolas. “Mas eles não se identificam quilombolas mesmo com evidencias intensas”, revela, “isto se dá por influência de uma cultura hegemônica onde predomina o racismo e por não ter espaços de discussão que relembre a história de como a comunidade se formou acabam não se identificando”. Durante conversas informais, a Caravana questionou o que motivou o nome da região ser Serra Negra. Foram duas histórias diferentes ouvidas, mas que mantem certa semelhança. Serra, em ambas, na verdade é cerra, do verbo cerrar – porque na época a região possuía muitas arvores – conjugado no modo imperativo, e Negra, é a escravizada, a mulher negra.

Na primeira a história o nome vinha das ordens dos jagunços que chibatavam as mulheres negras escravizadas enquanto cerravam utilizando o cerrote com cabos em ambos os lados. Quem contou esta versão foi Jose Reinaldo, morador da comunidade de Caetanos. A outra versão é a história de uma mulher que não aceitava ser escrava e pelo desejo de liberdade fugiu. Quando encurralada pelos jagunços se escondeu dentro de um tronco de arvore. Estava viva quando a encontraram, o fazendeiro, dono das terras, e sem escrúpulos, mandou cerrar o tronco com a mulher dentro. Esta versão, ainda pior que a primeira, foi contada por seu Deuslindo da Cruz, pai de Dorival. “Nunca esqueceremos as historias deste lugar, é um lugar de resistência e os moradores precisam entender a importância disto, a escravidão no Brasil ainda é negligenciada por grande parte da população brasileira” comenta a jovem Nayra Menezes, também integrante da Caravana.

Já na cidade, durante os dias 9 e 10 aconteceram apresentações teatrais para crianças e adolescentes na Escola Maria da Gloria Rego Azevedo, no Centro Educacional de Aracatu, no Colégio Estadual Coronel Candido da Silveira Santos, no Centro Municipal de Educação Infantil São Pedro e no Centro Social Madre Maria Miguel. “Nosso trabalho foi apresentar temas como a desigualdade social, o desmonte dos direitos sociais desde que o golpe se instalou no Brasil, além do papel crucial que a juventude tem diante de tudo isto”, explica Nayra. “Para que os espectadores absorvam nossa mensagem é preciso que eles sejam mais que só espectadores, eles precisam se ver como agentes de transformação, no teatro é eles que entram em cena, e nos jogos é onde eles entendem os projetos que estão em disputa na sociedade”, acrescenta a jovem caravanista.

Malhada de Pedras recebeu a Caravana no período em que o MPA comemora 15 anos de atuação no município. Quem acolheu ao grupo foram as comunidades de Lagoa Comprida e Tanque da Onça. Durante os dias 11 e 12 os jovens integrantes da Caravana foram recebidos nas casas de moradores das duas comunidades. O motivo da visita: conversar sobre a conjuntura do país e fazer o convite para uma noite cultural. Na noite da sexta-feira, 11, os alunos da Escola Estadual de Malhada das Pedras receberam a Caravana. Evanio Oliveira, da coordenação municipal fala da importância da passagem da Caravana: “Conscientizar a juventude para a necessidade de se organizar para resistir qualquer forma de opressão e evitar a continuação das reformas do mau, como a reforma da previdência”.

Na manha do último domingo, 13, a Caravana se reuniu com alguns jovens das duas comunidades na capelinha da Lagoa Comprida. O fechamento da escola de 1º a 4º ano que havia na localidade e o regate dos festejos de São João para incentivar a cultura local foram os temas mais debatidos. “A escola foi fechada sem consulta dos moradores, era uma escola multi-série, que ajudava muito os pais e mães, hoje as crianças precisam andar muitos quilômetros pra chegar à escola mais próxima, fora que traria empregos pra cá, pra professora, merendeira”, defende a jovem Paula, moradora local. “Se tivéssemos o retorno da escola aqui, a festa junina, organizada por ela, mobilizaria muitos moradores”. Durante a conversa os jovens relataram que a festa de São João há tempos não é organizada no vilarejo, levando muitos se deslocar ao centro urbano para participar dos festejos. “Uma pena porque as festas juninas tem origem camponesa, e ultimamente tem perdido este caráter”, finaliza Evanio.

A Caravana está desde segunda-feira 14 de maio, na região do Recôncavo Baiano, onde continuara os trabalhos junto ao povo.



Mateus Menezes | Jornalista

Comunicação Caravana Nacional