Entre 2007 e 2015, casos de
trabalhadores da agropecuária que tiraram a própria vida cresceu o dobro da
média nacional. Exposição aos agrotóxicos é considerada a principal causa.
São Paulo – O agronegócio é o
setor econômico que concentra as maiores taxas de suicídio entre trabalhadores.
De 2007 a 2015 foram registrados 77.373 suicídios, cerca de 8.597 por ano.
Corresponde a uma mortalidade anual de 8,9 por 100.000 indivíduos em 2007, e de
10,5 em 2015. O dado consta da edição de agosto do Boletim Epidemiológico do
Centro Colaborador da Vigilância dos Agravos à Saúde do Trabalhador do
Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Segundo os autores do artigo, a
perda do emprego e o desemprego prolongado levam ao desalento, à depressão e
outros transtornos, que por sua vez levam a pessoa a tirar a própria vida. Além
disso, condições de trabalho e emprego específicas, que levam ao estresse psicológico no trabalho, como
violência e assédio, ou mesmo o contato com substâncias químicas que produzem
alterações endócrinas no funcionamento neuroquímico, podem também desencadear
transtornos mentais ou neurológicos que evoluem para o suicídio.
Segundo o Boletim, o suicídio é
menos frequente em homens e mulheres na faixa etária a partir dos 25 anos até
36-45 anos. E maior entre aqueles com maior idade. No entanto, é mais comum
entre as trabalhadoras mais jovens, que nem chegaram aos 25.
Ainda não há um consenso sobre as
causas desse fenômeno complexo e multifatorial, que afeta de maneira perversa
também os amigos e familiares. Do que se sabe atualmente, entre as explicações
estão a baixa renda, a instabilidade no
emprego, pressão por produtividade, acesso limitado à educação e aos serviços
de saúde de qualidade.
Agrotóxicos
No entanto, resultados de
diversos estudos sugerem que a exposição a substâncias químicas, presentes nos
agrotóxicos, pode ser uma causa importante. Muitas delas, por sua ação no
sistema nervoso central ou desreguladora do sistema endocrinológico, estão
associadas ao aparecimento da depressão, ansiedade e doenças neurodegenerativas,
entre outros transtornos mentais causadores do suicídio.
“É necessário mencionar que
algumas ocupações, ao facilitar o acesso a venenos que podem ser letais,
permitem circunstâncias favorecedoras do suicídio”, destacam os autores do
Boletim.
A associação entre trabalho na
agropecuária e suicídio não é exclusiva do Brasil. Em várias regiões do mundo,
estudos confirmam essa relação. É o caso de uma comparação entre todas as
pesquisas de alta qualidade publicada em 2018 por pesquisadores do Instituto de
Pesquisa em Saúde, Ambiente e Trabalho da Universidade Rennes 1, da França.
A proteção da exposição a
agrotóxicos, como exercício do princípio da precaução, é recomendada por
estudiosos, pela Organização Mundial da Saúde(OMS) e pelas Nações Unidas (ONU),
que recomendam a eliminação do uso dessas substâncias e a transição para
práticas agroecológicas, fundamentadas na sustentabilidade.
“A mortalidade por suicídio em
trabalhadores da agropecuária foi estimada em 16,6 x 100.000 em 2007, aumentou
para 18,6 em 2011 e saltou 20,5 em 2015. Isso representa o dobro da média
nacional em cada ano. Em comparação, trabalhadores da indústria tiveram 10,8,
11,8 e 14,2 x 100.000 em cada ano, valores mais próximos das estimativas
nacionais, com cerca de 20% de diferença. É a expressão do genocídio do
agronegócio”, afirma a médica Raquel Rigotto, professora e pesquisadora do
Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade
Federal do Ceará (UFC) e coordenadora do Núcleo Tramas – Trabalho, Meio
Ambiente e Saúde.
Publicado por Cida de Oliveira,
da RBA (Rede Brasil Atual)
Acampamento da Juventude dá continuidade o processo de resistência camponesa.